PEC do Semipresidencialismo: deputados buscam alterar a Constituição e redistribuir o poder no Executivo

A PEC do semipresidencialismo foi protocolada na Câmara dos Deputados na última quinta-feira (06). A proposta visa reacender o debate sobre a possível mudança no sistema político brasileiro, que, desde 1889, adota o presidencialismo, substituindo a Monarquia Constitucional Parlamentar do período imperial.
Essa não é a primeira vez que o parlamento tenta alterar o modelo político do Brasil. Em 1993, um plebiscito nacional permitiu que os brasileiros escolhessem entre presidencialismo, parlamentarismo ou a restauração da monarquia. O presidencialismo venceu com cerca de 55% dos votos e permanece sendo o regime vigente até hoje.
“Os parlamentares têm travado uma disputa pelo protagonismo das ações públicas com o governo. As emendas parlamentares, utilizadas para financiar obras públicas em locais estratégicos para os deputados, se tornaram um trunfo nessa disputa, superando a casa dos bilhões, o que tem pressionado as contas públicas e o orçamento destinado a ações do governo”, destaca Wallyson Soares, advogado especialista em direito constitucional e eleitoral.
Vice-presidente da OAB do Piauí, Soares esclarece que o uso das emendas parlamentares e a intenção de mudar o sistema político não são inconstitucionais. No entanto, considerando a situação atual de instabilidade entre os poderes, ele acredita que esse não seja o melhor momento para essa discussão. “Com os deputados em confronto com o governo para aprovar pautas importantes, o presidente enfrentando impopularidade devido aos preços de alimentos e combustíveis, além das relações internacionais tensas com os EUA e a Argentina, que ameaça construir um muro para separar o Brasil e taxar produtos brasileiros, acredito que esse debate pode agravar ainda mais os conflitos. Isso não seria positivo para nenhum dos poderes neste momento”, conclui.
O semipresidencialismo é um sistema político híbrido, combinando aspectos do presidencialismo e do parlamentarismo. Nesse modelo, o poder executivo é compartilhado entre o presidente da República e um primeiro-ministro, com responsabilidades distintas. O presidente, eleito pelo voto popular, exerce funções como representar o país, comandar as forças armadas e conduzir a política externa. Já o primeiro-ministro, nomeado pelo presidente, depende do apoio do parlamento (Congresso ou
Assembleia Nacional) e é responsável pela administração pública diária e implementação de políticas.
Se a PEC for aprovada, o presidente assumiria um papel mais estratégico, intervindo em momentos de crise, enquanto o primeiro-ministro lideraria o governo. O primeiro-ministro, porém, poderia ser destituído pelo parlamento por meio de um voto de desconfiança. “Na prática, a proposta oferece mais flexibilidade para mudanças de governo. Se o governo perder apoio no parlamento, o primeiro-ministro pode ser substituído sem a necessidade de novas eleições gerais, ao contrário do presidencialismo, onde o presidente permanece no cargo até o fim do mandato, salvo impeachment”, explica o advogado Samuel dos Anjos.
Países como França, Portugal, Rússia, Alemanha, Espanha, Itália e Finlândia adotam esse modelo, visto como um equilíbrio entre o presidencialismo, que concentra muito poder no presidente, e o parlamentarismo, onde o governo depende do parlamento. Alguns especialistas acreditam que o semipresidencialismo pode oferecer maior estabilidade política, evitando crises prolongadas de governabilidade, enquanto outros afirmam que o modelo pode gerar crises intermináveis pela disputa pelo controle político. “Se não houver um sistema eleitoral sólido, pode haver trocas frequentes de governo, prejudicando a continuidade administrativa. Além disso, pode ocorrer uma excessiva influência de partidos políticos e grupos parlamentares. Como o primeiro-ministro não é eleito diretamente pelo povo, sua legitimidade pode ser questionada”, pondera Samuel dos Anjos, especialista em direito eleitoral.
Protocolada na Câmara, PEC do semipresidencialismo vai precisar um alto grau de consenso político, exigindo o apoio de 60% dos parlamentares em duas votações em cada Casa. Esse rigor busca garantir a estabilidade constitucional e evitar mudanças impulsivas na estrutura política do país.
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